Autor(es): Martha Beck e Cássia Almeida – O Globo – 19/09/2013
Uso de normas contábeis internacionais provoca diferenças no pagamento de Imposto de Renda
Brasília e Rio – A Receita Federal decidiu fechar uma brecha na legislação para evitar que grandes empresas paguem menos Imposto de Renda (IR) sobre seus lucros. A instrução normativa 1.397, publicada na última terça-feira no Diário Oficial da União, esclarece que as pessoas jurídicas de grande porte (com faturamento anual acima de R$ 300 milhões) devem apurar seus resultados com base no padrão contábil antigo, que vigorou até 2007, e não de acordo com normas contábeis internacionais (IRFS), que foram adotadas para dar mais transparência ao mercado. Segundo o Fisco, cerca de 600 empresas serão afetadas.
As grandes companhias passaram a trabalhar com as normas contábeis internacionais em 2008. Desde então, como não havia orientação clara da Receita, apuravam o lucro que deveria ser tributado com base nessas normas, o que, em muitos casos, acabava reduzindo o IR a pagar.
Segundo o Fisco, as empresas vinham tratando como isento o lucro societário calculado no padrão IRFS. Por isso, agora, a Receita quer que esses contribuintes façam uma retificação nas declarações para pagar o lucro que tiver sido tratado como isento indevidamente.
As empresas que estavam distribuindo todo lucro societário estavam usando uma isenção indevida. O procedimento corrto é retificar as declarações, consignar que é passível de tributação, e os destinatários devem fazer o ajuste na declaração do IR da pessoa física ou jurídica — disse o subsecretário de Tributação, Fernando Mombelli.
O técnico do Fisco negou que a nova instrução resultará em custos adicionais. Tributaristas alegam que ela vai obrigar as pessoas jurídicas a manterem duas contabilidades, uma com base na IRFS, e outra pelas normas antigas, apenas para o cálculo dos tributos. Segundo a Receita, no entanto, as empresas do lucro real já tinham de fazer a apuração pelo sistema contábil antigo.
— Só está fazendo duas contabilidades agora quem não estava fazendo correto. A gente está especificando essa forma de fazer essa escrituração contábil e fiscal de forma mais detalhada — disse o subsecretário substituto de Fiscalização, Iágaro Martins.
Para o advogado tributarista Diego Miguita, do escritório Vaz, Barreto, Shingaki & Oioli Advogados, a nova instrução da Receita cria uma figura inédita no direito fiscal: o dividendo tributado. Segundo o especialista, se o lucro pelas normas internacionais tiver sido maior do que o fiscal, deverá ser pago o imposto.
— Na prática, essa instrução obriga que a empresa produza dois balanços. O dividendo é isento porque as empresas já pagam imposto quando apuram o lucro real. Essa instrução extrapola os limites da lei.
Paulo Fernando Monteiro, advogado tributarista da OAB-SP, não vê surpresas. Para ele, a instrução veio apenas a consolidar normas que a Receita já vem editando sobre a questão.
— Na lei societária, a empresa pode decidir que a depreciação de um bem se dará em oito anos, mas a lei fiscal diz que deve ser de 20% em cinco anos. Isso muda o lucro da empresa. Só terá surpresa aqueles que fizeram uma interpretação que os favorecia. Há uma complexidade tão grande que é difícil que grandes empresas não tenham feito a lição de casa. Com o Fisco, quem paga errado paga duas vezes.